terça-feira, 24 de março de 2009

Tempestade num copo de cerveja

Quando o morto começa a feder o melhor mesmo é enterrá-lo. Já passaram três dias sobre a fatídica final da Taça da Liga e ainda não se fala de outra coisa: o Sporting demite-se da liga; o Benfica emite comunicados; o árbitro assistente é um benfiquista dos sete costados; a Comissão Disciplinar da Liga vai abrir inquéritos a metade da equipa do Sporting; o Lucílio Batista recebe ameaças de morte, etc, etc.

Sinceramente, há uma coisa que, desde Sábado, me está intrigar sobremaneira: quando uma equipa está a ganhar por um - zero e sofre um golo, o resultado passa a ser um a um, certo? Se bem me lembro, e corrijam-me se estou em erro, a lei 10 das Leis do Jogo (futebol de 11, entenda-se) dispõe que quando as equipas marcam o mesmo número de golos o jogo é considerado empatado, certo? Os jogos de futebol de séniores têm a duração de 90 minutos, sendo constituído por duas partes de 45 minutos e um intervalo que não deve exceder os 15 minutos, certo? O jogo de sábado não acabou aos 74 minutos, pois não? O meio oficial de desempate na final da Taça da Liga é a marcação de pontapés da marca de grande penalidade., não é assim?

Meus amigos, os dirigentes do Sporting querem convencer-nos da verificação de um nexo de causalidade que os próprios nunca conseguirão provar: a derrota do Sporting não ficou a dever-se ao erro flagrante da equipa de arbitragem. O empate no jogo, sim. A derrota, não. Esta é a verdade dos factos. Qualquer tese em contrário não passa de pura especulação, de uma colocação de hipóteses indemonstráveis.

Erros de arbitragem vão existir sempre. O mesmo se diga sobre os falhanços dos jogadores, treinadores, dirigentes e até mau comportamento de adeptos.

A sociedade aceita de forma pacífica (e como podia não aceitar) algumas alternativas à verdade absoluta. Veja-se o caso da Justiça. Busca-se no tribunal a verdade material mas, quantas vezes, esta é impossível de alcançar. A Justiça basta-se com a verdade meramente formal, muitas vezes errada. No futebol, os paladinos da verdade, procuram encontrar a verdade absoluta, a todo o custo. O futebol é feito por Homens e para Homens. O erro é inerente. Quem decide tem de o fazer em milésimas de segundo, condicionado por factores exógenos (ângulos de visão, movimentos dos jogadores, direcção da bola, comdições atmosféricas, luz artificial, etc.) e endógenos (estados de espírito, fadiga física e mental, pressão provocada por dirigentes, mass media, avaliação do observador, etc.). A verdade será sempre subjectiva: de quem decide. Apenas podemos exigir que os juizes do jogo estejam preparados tecnicamente para que a sua subjectividade esteja, quase sempre, em consonância com aquilo que, por vezes, é objectivamente correcto. Muitas das vezes a subjectividade de quem decide apenas não está de acordo com uma outra subjectividade: a do sujeito da decisão. Contudo, não quer dizer que esta seja a correcta.

Pá, acabem com a palhaçada. Tudo o resto são utopias.

sexta-feira, 20 de março de 2009

TWO HANDED - IV

Na língua falada é rainha a preguiça, com os "tá" ou outras reduções no palavreado, palavra do senhor Veado, respeitoso tratamento às violetas brasileiras, não fosse larilas sinónimo de lilás. Já a esta hora os puristas da cor reclamam distinção entre o lilás e o violeta, o que returco, dizendo que mais puro do que o preto não há, afinal a ausência de cor. Turco é quem nasce em Istambul, ainda que o bule de chá seja mais costumeiro em terras britânicas, onde é lei a common law."Come on, come on, come on Eileen", bela música dos Laboralistas, num incentivo ao activismo político, não de actor mas de perpetuador do bem comum, fossem lá os políticos capazes ou mestre de obras.

Mas o mestre de obras não gosta de cobras, ali no Jardim Zoológico... Na verdade é um pouco ilógico guardar animais em jaulas ou até putos nas aulas. Concordo mais com os gregos e as suas lições peripatéticas. Um tal de Walt ainda tentou criar as lições peridonáldicas mas verificou que havia uma enorme dificuldade de compreensão por parte dos alunos, aqueles que negam a existência da lua. A Lua, esse sítio onde se dão passos gigantes para a humanidade, mas ainda não descobrimos a cura para a humidade. É que chega-se a uma certa idade e aquilo dá cabo dos ossos, essa conhecida patente da GNR que combate a osteoporose, ou criação de poros na hóstia, corpo de Cristo, Amen. Pela Zoológica, a hóstia devia ter recheio de morango e cobertura de chocolate, ou seja, chocos cobertos de leite. O leite misturava-se com a tinta e depois ia ser a bonita, com a língua sarapintada. Estás pintada, Sara?

quarta-feira, 18 de março de 2009

Pedaços de Prosa I

Perante o frio, sempre gostei de erguer o queixo, cerrá-lo firme, cortando a pequena frente de ar frio, que se me destina. A isto acrescento o emergir da gola do sobretudo. Foi assim em Dezembro, décimo segundo mês do ano 2008, à católica maneira contada. O povo, em tema de conversa desesperada, debruça-se, amiúde, sobre ele, queixando-se, elegendo-o como responsável pela maleita social, em co-responsabilidade com o fenómeno da pluviosidade, que nem por alimentar a nossa agricultura merece indulto popular. Sois o diabo, chuva e frio, talvez até por isso: ser o plural de Sol, Sóis.

Arrepio, não o caminho, mas o corpo em involuntário acto, no entanto, perfeitamente consciente. À memória, acorro-me pousado numa toalha de praia, em pleno Verão, em pleno nada fazer, senão aquietar-me de sono. Nisto se finda o repouso e acordo: afinal são 18 de Março de 2009, estão largos 18 graus Celsos, pelas 08h matinais. Ao quente fui, mesmo sabendo aguardarem-me montes de letras imprimidas, em pouco atraente papel. Ler e calor, o binómio que não domino

segunda-feira, 16 de março de 2009

Uma Vénia


Dir-se-á que o mais virtuoso é aquele que melhor usa as suas qualidades, potenciando-as ao limite e minora ou camufla as fraquezas. Assim está o F. C. do Porto. Venho, muito humildemente, aplaudir o Prof. Jesualdo Ferreira e o apogeu do seu futebol, mesmo contra uma equipa fechada como a Naval. Retracto-me, em parte, da falta de crença na filosofia do professor das transições rápidas e futebol directo, que afinal rumam a bom porto, haja colectivo, como de facto há (com muito apoio e excelente ocupação colectiva dos espaços). Este momento de forma é dos jogadores, mas é sobretudo de quem os dirige. Não sendo, nunca, esta a minha filosofia de jogo (prefiro o futebol com posse de bola, muito à Barcelona), tenho de ceder perante a eficácia do Professor, quer contra equipas com defesa alta, quer (finalmente) contra equipas com o bloco defensivo muito recuado. Eis então a virtude do Porto: retirar da soma individual dos jogadores, um plus imbatível. À Europa, que o Burgo já é nosso!

quinta-feira, 12 de março de 2009

Crónica de um Guarda-Redes amargurado

O que faço aqui? Que jogo é este? Puxei as redes por seis vezes, e sempre o mesmo peixe redondo, sem cheiro, sem cor, intragável.
A minha equipa, digo, os meus colegas (já não somos uma equipa) discutem entre si, trocam palavras ferozes e ingratas... e na verdade, cada um consegue apenas ouvir a sua voz própria voz, o eco abafado da solidão.
Deitam os olhos à relva... a relva desesperantemente verde, bem aparada para que a bola continue a correr de forma natural, a prolongar a nossa tragédia e a minha vergonha. Porque não se enrola simplesmente, como uma língua felpuda, e nos afoga a todos na sua saliva de terra?
Se ao menos pudesse ter-te aqui, mãe... Pousar a minha cabeça em teu regaço e acabar com o sofrimento. Deixar que as tuas palavras doces me beijassem os ouvidos e me acariciassem as pálpebras até adormecer: "Não te preocupes, está tudo bem."
Mas olho para a frente e vejo-os avançar, furiosamente. Atacam com o mesmo apetite voraz de há cinco minutos atrás... Não têm fome, já não podem ter fome, mas continuam a comer, insaciáveis. Falam uma língua estranha, não percebo o que dizem. Tem um timbre forte, grave, autoritário. Parece que estão constantemente a dar ordens uns aos outros. E cumprem-nas... Cumprem-nas de forma diligente e eficaz.
Que engraçado... ocorreu-me uma música. Há muito tempo que não a ouvia. E ouço-a agora, inesperadamente, na minha cabeça. O que a terá feito surgir aqui? Tento sibilar o refrão. Não me lembro da letra. Mas é uma boa música, sem dúvida. Fica no ouvido.
E eles avançam... Um jovem possante corre desenfreadamente com a bola, pelo lado esquerdo. Leva um rastilho aceso nos pés. À medida que ele avança, o rastilho vai-se consumindo. Quando estiver mais perto de mim, o rastilho chegará ao fim e o canhão das suas chuteiras irá disparar, com estrondo, uma bola de fogo. Tenho de estar pronto... Desta vez estarei pronto.
Cerro os punhos. Uma gota de suor percorre-me a cara. Não devia ter cortado a barba hoje de manhã. O suor abrasa-me a pele. Nota mental: não voltar a cortar a barba em dias de jogo. O rapaz avança. Temos a mesma idade. E no entanto, invejo a sua força, a sua velocidade, a sua determinação. Passo uma luva pelo queixo, para tentar limpar o suor. O rapaz avança. Num gesto rápido, esfrego as luvas na camisola. Ele está cada vez mais perto. Flicto as pernas. Ele puxa a culatra. Abro as mãos. Arregalo os olhos. O coração galopa. Ouço o canhão. A bola voa... Lanço-me com todas as minhas forças para a abraçar no meu âmago, para que ela nunca mais me faça infeliz...Os meus dedos esticam-se o mais que podem, os meus braços crescem enquanto salto. Todo o meu corpo quer aquela bola. O meu peito quer aquela bala. Eu sou o guarda-costas que se lança de forma altruísta para salvar o presidente e o país. Eu sou um Deus que quer agarrar o Mundo e torná-lo um mundo melhor, para sempre... Eu sou um pássaro... Sou o vento...
Mas de repente, o mesmo silêncio. Um pequeno istmo que separa o fragor das bancadas daquele som seco e prolongado da bola que bate na rede.
Caio desamparado no relvado, qual Ícaro desenganado.
O jovem que fala uma língua estranha vira-se para os seus colegas e sorri de forma cruel. Olha para mim com ar piedoso, o que o torna ainda mais cruel.
Já ninguém festeja o golo. As pessoas limitam-se a rir. Nas bancadas, soltam-se gargalhadas sonoras e trocistas. Homens, mulheres e crianças, todos se riem do nosso desespero, da nossa trágica incapacidade para travar as rodas dentadas da máquina voraz que nos continua a mastigar e engolir sôfregamente.
Todos riem. Todos riem menos nós. Visto do céu, o estádio é uma enorme boca de língua verde que ri alarvemente.
Olho o mister. Senta-se calmamente no banco com olhar autista. Não há nada a fazer. Nunca houve. É o destino. Estamos tristes... Mas do outro lado há muita gente contente... Se calhar há mais gente contente do que triste. Menos mal. É melhor assim.

domingo, 8 de março de 2009

Mulheres de Ninguém I - Dioptria

Dipotria, meu amor,
espelho da minh'alma enevoada.
A terra é uma seara de dor,
o mar ondas de sargaço.
Mas se o peito repouso em teu regaço,
olho a terra e o mar: não vejo nada.

Aceita estes ósculos graduados
como prova singela do meu encanto.
Todos os males sofridos são passados,
o bem é presente e não futuro.
Amemos nossos corpos no quarto escuro.
A luz é pérfido quebranto.

A ver no mundo só escolhos,
prefiro, meu amor, ter-te nos olhos.

sexta-feira, 6 de março de 2009

PRORSUS II



Uma simpática hipérbole no nosso HAIKU II, que grita o prostrado anacoretismo, que a hodierna sociedade instiga, em subliminar chantagem, o comum e concreto cidadão. A, há muito inventada, Democracia, que historicamente emergiu com a Revolução Francesa (ou já surgira na cidado-estado de Atenas, na longínqua Antiguidade Clássica) está em nítida crise, desacreditada pelas ineficientes políticas estaduais, não direi tanto ao nível económico, mas social (educação, saúde e justiça), democracia essa como base política para atingir uma equitativa qualidade de vida.

Não foi aleatória a escolha do melro: é uma ave que se adapta bem ao tecido urbano e um simbólico animal que exclama o anonimato social e a individual sobrevivência, regada com egoísticos e mundanos satisfazeres.

O desafio futuro e planetário é óbvio: entusiasmar as massas sobre as virtudes da democracia e, nesse exercício, talvez fosse fácil começar pela brilhante frase de Sir Winston Churchill: “A democracia é o sistema político mais imperfeito, à excepção de todos os outros.”. Isto, bem aprendido, deveria ser o suficiente para suscitar a intervenção plural das pessoas na democracia, com duas consequências mais imediatas, independentemente da intervenção como actores directos na cena política: a primeira, uma melhor consciência no sentido de voto, uma melhor responsabilização pela opção partidária ou no candidato, consoante a eleição sub judice; a segunda, mais ambiciosa, terminar ou minorar o constante e aborrecido desculpar do fracasso social, com a inoperância ou incompetência dos políticos, não que os considere competentes, mas porque abomino a crítica que não oferece a resposta.

quinta-feira, 5 de março de 2009

Haiku II













Um melro triste
o seu luto repousa
na amendoeira.

terça-feira, 3 de março de 2009

Two Handed III - Esgotamento

Chovia enquanto o cego atravessava a rua, vendo ao longe uma bela charrua, na qual nunca ninguém fumara, senão o cocheiro, que jamais cheirara o salitre ou agarrara uma concha empurrada para fora da água e borda fora fora o Peter Pan, que nunca teve em sua mão uma pá ou apanhador. Noto, se me permitem, ser deveras complicado correr o bastante para interceptar a dor, sobretudo aquela súbita e inesperada que nem uma pontada, na barriga que merda quer expelir. Impelido à força do músculo anal, eis que ele exulta recto fora e mergulha decidido, no poço, túnel imenso, sem luz, dia ou noite, mas apenas com comparsas nojentos, que nem disfarçam a farsa de mau cheiro, que já nem denotam. Um dia, à socapa duma estranha gravidade aquática, desaguam num salto de ponta de esgoto, em direcção à agitada onda do mar, que domada só por engano, por força da edificação dum paredão ou esporão.

Exporão, no futuro, os nossos netos, as fotos desse esgoto a céu aberto. Sim, porque o céu também se fecha, ao contrário de quem larga a ameixa. Por falar em largar, deNoto uma tendência do meu parceiro para este verbo ventoso. Eu prefiro o Zéfiro gentil, mailo o meu homónimo prefixo. É esse o preço pré fixo de nos darem, sem perguntar, o nome do adulterado marido por obra e graça do espirro santo, ai mãe. Cuidado para onde espirram com “ó”, meus amigos. Os milagres acontecem, como as aranhas que apanham outros insectos sem setas. Não são é muito sensatas, ao fazê-lo nas beiras das portas. Há muitas correntes de ar... e voltamos ao mesmo. Resfriados e flatulências. Já dizia a minha avó: quem obstipa constipa. Sábia teoria, corrobor(r)ada por um Doutor incontinente que a vacinou certo dia: “a cerveja alemã do Lidl resolve congestões nasais e engarrafamentos intestinais. Edifica, São”.