quinta-feira, 28 de maio de 2009

A notícia

Como virá a notícia?
Na folha fria de um telegrama,
ou no quente abraço de um amigo?
Sussurrada por alguém que me ama,
ou anunciada por um estranho, ao postigo?

Como chegará a notícia?
Vestida com seu roto manto
de comiseração e lamento,
ou despida no negro espanto
de um claro pressentimento?

Como chegará a notícia?
Na pretérita surpresa
das páginas de um jornal atrasado,
ou na dolorosa presteza
de um telefonema enervado?

Como virá a notícia?
Caída nas folhas ventadas
pela rouca voz do Outono,
ou dita pelas flores petaladas,
estonteadas de sono?

Como chegará a notícia?
Com a aurora sobressaltada?
No repouso de um dia de sorte?
Como chegará a notícia
da tua morte?

sábado, 16 de maio de 2009

Parabéns

Num quarto fechado, sem janelas, equipado com iluminação eléctrica, a diferença entre a luz e o escuro cifra-se num mero interruptor. The old english saying: on/off. No quotidiano das sociais relações, as trevas e o amor ocupam os mesmos espaços e os mesmos agentes, tornando tarefa herculiana distingui-los, com suplementar característica da mesma coisa ser hoje amor e amanhã trevas. Neste inconhecimento inultrapassável, resta viver cada tempo diário. Isto hoje porque é dia do aniversário dela, dela sinónimo de Trevas, antónimo de Amor, outrora o inverso.

Permito-me, agora, em jeito de prenda de aniversário, lembrá-la no tempo de Amor. Anotem: alta,inteligente, bonita sub e objectivamente, magra, activa e cultivadora de humor abstracto. Mais não consigo porque é este diabo que só me contacta para falar do Dinis. Sempre só do Dinis, nunca de mim e nunca do antigo apaixonante sorriso dela.

A pergunta é a seguinte: como nos transformamos nós em cães abandonados e elas se mantêm tão equidistantes ao que, idos tempos, chamaram de paixão e amor? A resposta, que não atrevo a covardemente guardar, está na sua condição maternal.

domingo, 3 de maio de 2009

Pedaços de Prosa III

Hoje novamente o Sol, filtrado por um limpo horizonte do céu, e a alta temperatura empurrada pela ausência de vento. Quando será tempo de deixar este sono inacabado de ontem dominar-me num pós-almoço? Quando será tempo de me permitir impor o meu relógio biológico sobre a ditadura das responsabilidades profissionais?
Férias a resposta, desde que devidamente acentuada a palavra, pois "ferias" é já o que este Sol me faz ao gritar-me que desprezo o gozo que ele, em potência, me permite, pela sinfonia de relax que me destina. São nesses autênticos bordéis, mundanamente chamados de esplanadas, que onteontem me rendi ao Deus Sol.
Contei os pássaros pousados, mas vivos, em plena Avenida dos Aliados; ri-me, em ligeira troça de mim, invejando os vestuários informais dos turistas; li o nome das lojas, rés-do-chão; primeiro e segundo andares; bebi o café; lembrei-me dela e compensei engolindo água. Foi, então, hora de me abandonar e regressar aos outros, aos problemas dos outros, afinal a definição real de Advogado.